SJP não cumpre lei de acessibilidade
Ruas, comércios e prédios têm projetos distantes do que prevê legislação
10/06/2011 08:06
O contador Alberto Nogueira em um dos prédios comerciais
que não tem acesso a cadeirantes
O termo acessibilidade só começou a ser ouvido de fato na última década. Foi então que profissionais, instituições e políticos uniram-se para tentar resolver uma das grandes barreiras urbanas ao direito de ir e vir. Permitir o acesso de pessoas com deficiência a todo edifício, transporte, mobiliário e elementos urbanos se tornou lei ainda no ano 2000. Uma década depois, mesmo ouvido, o termo acessibilidade ainda não ganhou força nas grandes cidades brasileiras. São José dos Pinhais é um exemplo.
Com a quarta maior arrecadação do estado, e um imenso crescimento populacional, o Executivo e o Legislativo municipais ainda não estabeleceram regras para a adequação da cidade à lei federal. Alguns projetos foram aprovados na Câmara dos Vereadores, porém, dizem respeito ao acesso em ônibus, cardápio em restaurantes, preferência em filas e cadeiras de roda. Nenhum deles fala sobre a obrigatoriedade de se adequar projetos ao livre acesso de pessoas com deficiência.
No Executivo, o Código de Obras do município está para ser reformulado. Nas modificações, alguns critérios específicos para quando o projeto já prevê elevadores ou rampas. Nada que obrigue novas construções a se adequar à lei (veja texto a seguir).
Somente este ano, a prefeitura liberou 59 alvarás para construção de empreendimentos do comércio. Nenhum deles teve fiscalização quanto acessibilidade.
“O município entende que é de responsabilidade do profissional técnico o enquadramento às normas”, diz a diretora do Departamento de Gestão Urbanística, da Secretaria Municipal de Urbanismo, Beatriz Almeida. “A responsabilidade do município é com os parâmetros urbanísticos”, reforça.
Segundo a diretora, a prefeitura não tem a atribuição de fiscalizar o cumprimento da lei de acessibilidade pois para a liberação do Alvará é preciso que o engenheiro e arquiteto apresentem a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART). “Nesse documento, o profissional se responsabiliza a cumprir as normas. Ele presta informações a seu conselho e é este quem deve fiscalizar”, ressalta Beatriz.
“Nós não temos o poder de embargar a obra. Quem tem que fazer isso é a prefeitura”, contesta o ouvidor do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Paraná (CREA/PR), Antonio Borges dos Reis.
Ele explica que o CREA verifica se há profissionais habilitados nas obras mas que a fiscalização fica a cargo da prefeitura. “Podemos aplicar sanções por meio do nosso Conselho de Ética mas no que diz respeito à Legislação cumprida, os responsáveis são as Secretarias de Urbanismo dos municípios”, contrapõe.
Jogo do empurra
O empurra-empurra sobre a culpa para a falta de respeito à pessoa com deficiência fica ainda mais claro quando analisamos exemplos de construções recentes que não possuem nenhuma adequação ao termo acessibilidade. Um prédio localizado na rua Veríssimo Marques é um deles. Com alvará liberado este ano pela prefeitura de São José dos Pinhais, o edifício – que é um conjunto comercial – possui apenas uma escada para o acesso ao segundo andar.
“Já conversamos com o dono, porque isso dificulta muito nosso trabalho com os clientes. Tenho clientes cadeirantes, como vou fazer para atendê-los em minha empresa?”, questiona a corretora de imóveis, Monica Carvalho.
“Eu contratei profissionais para realizar essa obra e ela teve toda aprovação necessária da prefeitura. Ninguém me disse que precisava desse tipo de acesso”, sustenta o dono do prédio, Odair Quintilhano.
Já o engenheiro responsável, Nelson Mitiru, diz que o projeto foi feito com base no que estabeleceu a prefeitura e que, como ela não cobrou, não foi feito. “Hoje estamos mais conscientes sobre esta responsabilidade e abertos a modificações no projeto, caso haja interesse”, esclarece, lembrando que a execução da obra ficou a cargo da arquiteta.
Kely Lopes, a arquiteta responsável pelo projeto do prédio, diz que rampas e plataforma elevatória estavam previstas mas foram cortadas. “O proprietário foi orientado mas decidiu pela escada”, conclui.
“Se o projeto inicial foi modificado depois da aprovação, a obra tem que ser embargada”, sustenta Antonio dos Reis, ouvidor do CREA.
“Os profissionais ainda seguem muito o proprietário e esquecem que a acessibilidade é uma exigência legal”, completa o arquiteto Tobias Bonk Machado, da Associação dos Engenheiros e Arquitetos de São José dos Pinhais. Ele é o responsável pelo projeto de restauração da Catedral de SJP, agora totalmente adaptada para receber pessoas com deficiência.
Sem adequações
O prédio citado acima chama atenção por ter sido inaugurado há pouco mais de um mês. Mas existem muitos outros comércios e prédios em São José dos Pinhais que, mais antigos, também não se adequaram às normas especificadas na lei federal 10.098/2000.
“Há muitos espaços com acesso restrito a pessoas com deficiência, como o próprio Fórum, a Galeria Municipal de Artes e o Colégio Silveira da Motta. Mas em alguns estabelecimentos não há acesso nenhum para nós”, revela o empresário e integrante da Associação dos Deficientes Físicos de São José dos Pinhais, Alberto Nogueira, que também faz parte da Federação das Entidades de Pessoas com Deficiência no Paraná.
“São muitos os comércios, inclusive na rua XV, que não possuem acesso nenhum a deficientes. Estes dias precisei ser içado pra conseguir entrar na loja. É lamentável”, analisa.
“O mais grave é o cerceamento à liberdade de ir e vir. Esses empresários estão impedindo o acesso a várias pessoas, não só deficientes. Como uma senhora com carrinho de bebê vai poder subir escadas; e um idoso com bengala?”, alerta.
Segundo Nogueira, em São José dos Pinhais são aproximadamente 39,5 mil pessoas com algum tipo de deficiência. “Estamos em contato direto com o Executivo mas as coisas não andam como o prometido. Tivemos algumas melhoras, como em vias públicas, mas ainda há problemas, especialmente com as guias rebaixadas, que nem sempre seguem as normas”, assegura.
Além do acesso a vias, prédios públicos e comerciais, Nogueira lembra que outro grande problema ainda persiste no quesito transporte público. “As duas empresas de ônibus da cidade ainda não adaptaram todos os ônibus. São alguns, em horários específicos, e muitos com os elevadores quebrados”, constata.
Lei nº10.098 - 19/12/2000
Estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação.
PautaSJP.com - jornalista Mauren Lucrecia
Lei Federal nº10.098 - 19/12/2000
Prédio novo na Rua Veríssimo Marques não tem acesso de rampa na calçada, rampa para o 2º andar ou elevador
Prefeitura deve manter calçadas em ordem e comerciantes darem acesso aos estabelecimentos comerciais
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